O FIM DA REPRESENTAÇÃO NO CRIME DE AMEAÇA CONTRA A MULHER: TUTELA LEGÍTIMA OU SUPRESSÃO DA AUTONOMIA DA VÍTIMA?
Resumo
A Lei nº 14.994/2024, que alterou o artigo 147 do Código Penal, trouxe importante inovação ao transformar o crime de ameaça, quando praticado contra a mulher no contexto de violência doméstica e familiar, em ação penal pública incondicionada. A modificação legislativa reflete o esforço do legislador em intensificar a atuação estatal na proteção da mulher em situação de vulnerabilidade, assegurando maior eficácia e celeridade na resposta penal. Todavia, essa alteração normativa também levanta relevantes questionamentos quanto aos limites da proteção jurídica conferida à vítima, sobretudo no que se refere à preservação de sua autonomia e ao princípio constitucional da igualdade entre os gêneros. O estudo em questão tem por objetivo analisar os impactos da Lei nº 14.994/2024 no processo penal no que tange à retirada do direito de representação da vítima nos crimes de ameaça em contexto de violência doméstica. A pesquisa se desenvolverá por meio do método jurídico-analítico, com abordagem qualitativa, fundamentada na análise de textos legislativos, artigos jurídicos e materiais técnicos disponíveis sobre o tema, considerando a recente promulgação da norma e a ausência de doutrina consolidada. Pretendese demonstrar que, embora a medida tenha o potencial de romper o ciclo da violência, ela também pode produzir efeitos colaterais indesejáveis, como o distanciamento da mulher do sistema de justiça. A ausência de protagonismo da vítima na persecução penal pode enfraquecer a confiança institucional e contribuir para o aumento da chamada “cifra negra” da violência doméstica. Diante disso, conclui-se que a Lei nº 14.994/2024, ainda que bem-intencionada, deve ser acompanhada de políticas públicas efetivas, que contemplem o fortalecimento da rede de apoio à mulher e garantam sua escuta ativa e respeitosa. A atuação do Estado deve observar, além da necessidade de punir condutas lesivas, o respeito às garantias processuais e à liberdade de escolha da vítima quanto à instauração da ação penal. A efetividade da norma dependerá, em grande medida, de sua interpretação jurisprudencial e da articulação com outras medidas legais e institucionais voltadas à proteção das mulheres em situação de vulnerabilidade.
PALAVRAS-CHAVE: Ameaça; cifra-negra; igualdade; ação penal pública incondicionada.
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