AFROENUNCIAÇÕES: IDENTIDADES FICTÍCIAS E MEMÓRIA NOS CÂNTICOS DO REINADO

Resumo

Este trabalho aborda os procedimentos enunciativos das cantigas de reinado, ou congado, festividade afrodescendente comum na região centro-oeste de Minas Gerais, a partir da Análise do Discurso de linha francesa, com o fim de averiguar o papel da ficcionalidade nesses discursos. Por meio da teoria Semiolinguística de Charaudeau ([2001] 2020a, [2004] 2020b, 2008, 1992, 1983) e da teoria da ficcionalidade proposta por Mendes (2004) e sua aplicação possível aos discursos de memória (Morato, 2016) observamos porque e como os cantadores do reinado constroem um universo simbólico e ficcional na e pela linguagem. Para tanto, tomamos os conceitos de contrato comunicacional (Charaudeau, [2004] 2020b, 2008), visada discursiva (Charaudeau, [2001] 2020a) e modos de organização do discurso (Charaudeau, 1992) para investigar essa enunciação e sua organização discursiva, e ao trabalho de Mendes (2004) e Morato (2016) para observar a manifestação da ficcionalidade e seu papel na construção dos discursos presentes na festa. Para melhor situar nosso objeto de estudo, recorremos também a uma discussão sobre os conceitos de cultura popular, segundo Burke (2010), Canclini (1989) e Chartier (1995), e de cultura afrodescendente, segundo Conduru (2007), Sakamoto ([2014] 2020), Gomes ([2003] 2020) e Góis (2008). De acordo com esta investigação, os enunciadores das cantigas de reinado encenam identidades fictícias (preto véio, nego, marinheiro, marujo) recorrendo à ficcionalidade com o propósito de manterem a memória do universo simbólico e a identidade da festa, marcada pela onipresença de elementos de história e memória afro-brasileira comunicados de geração em geração.

 Palavras-chave: Cultura Afrodescendente. Enunciação. Ficcionalidade. Memória. Análise do Discurso.